domingo, 6 de novembro de 2011

Mesmo que seja o Lula

Estava na banca de jornais estes dias e me surprendi com a reação de uma cliente que , ao ver as capas das revistas semanais daquela semana disse: "Não tem como escapar desta figura horrível figura do Lula? E completou: " Quero ver se ele vai tratar esse Câncer pelo SUS" e saiu pisando firme. Já tinha visto a campanha no Facebook ( "Lula, vá se tratar no SUS") e já previa o que viria a acontecer.

Agora , estou recebendo e-mails , inclusive de pessoas supostamente "éticas" desancando Lula  e obrigando ele a se tratar pelo SUS como se ele tivesse que se submeter à um remédio amargo como castigo pelo fato de ser um político famoso e pelas eventuais peripécias que aprontou no Governo.

Fiquei pensando : que triste ética esta que se espalha por todos os lados...um sentimento de raiva , vingativo como se a própria doença fosse uma espécie de "castigo merecido" que o tal político tem que enfrentar , se possível da pior forma possível , "pelo SUS" , enfrentando dificuldades e até com uma pontinha de desejo tipo " tomara que o tratamento não de certo".

Fico cada vez mais estupefato e surpreendido com as reações que as pessoas têm em relação às doenças dos políticos famosos - "se você é famoso prepare-se , qualquer coisa nós vamos torcer para que você se dê mal no seu tratamento!".

Considero esta uma atitude absolutamente anti-ética , desumana, típica de uma sociedade que vive uma grave patologia relacionada à banalização frente à doença frente à morte , frente aos princípios mais básicos de solidariedade e união da espécie.E me surpreendo também que isso não seja óbvio para a maior parte das pessoas.

Se o Lula foi ou é um político que algumas pessoas não gostam - no meu caso nunca votei em Lula , mas não deixo de admirar alguns aspectos da sua história , assim como considero péssimos outros - a meu ver a questão da doença do ex-presidente deve ser tratada com muita solidariedade e com todo apoio que se deva dar à qualquer ser humano com esse tipo de problema.

Coloque-mo-nos por exemplo no papel de médico do Lula ou de qualquer outro político . Então se discordar das idéias deste indivíduo vou tratá-lo de forma diferente ou inferior, vou deixar de utilizar todos os recursos que estejam disponíveis para tentar curá-lo ou aliviar o seu sofrimento? Ora, e se fosse o Fernandinho Beira Mar...também deveríamos tratá-lo mal ou desejar sua morte?

Bem , neste momento , dependendo da forma como você respondeu intimamente à esta questão uma grave questão ética esta colocada e a forma como ela vêm ocupando os espaços da mídia torna-a mais grave ainda configurando-se uma patologia social.

Sou médico; por dever de ofício sou obrigado à tratá-los igualmente como à qualquer outro indivíduo , mais ou menos rico , mais ou menos famoso, mais ou menos criminoso.

 E nós todos somos indivíduos da raça humana e devemos respeitar a doença de outros seres como nós desejando a sua melhora , a sua recuperação e ainda que tenha o melhor dos tratamentos.

Mesmo que seja o Lula!

*Omar Taha, 52 anos,  é médico em Londrina

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